terça-feira, 10 de agosto de 2010

Borracho esclarecido.


A madrugada pode ser surpreendente, ainda mais quando você bebeu muito e não está bêbado! Ok! Você agora vai dizer que eu estava bêbado e sequer sabia. Eu discordo, afinal, acabei de voltar “da madrugada”, e estou escrevendo este texto.

Estou há mais de 20 (vinte) horas sem dormir. Isso mesmo! Quase um dia! E tive reflexões impressionantes neste período de tempo. Bebendo na sarjeta com um amigo – colega – que conheço há apenas 2 meses, percebi situações que outrora nunca havia notado. Falando um pouco sobre nós, sobre como nos sentiríamos e agiríamos em situações “x” ou “y”, constatei muita indefinição. Questionado sobre minhas possíveis atitudes em certos possíveis momentos, afirmei que agiria de tal maneira, contudo, meu cérebro delatava – para ele mesmo – que eu não tinha certeza sobre aquilo, que estava respondendo perguntas baseado em probabilidades ou, muito provavelmente, por desejar agir daquela maneira.

Agora, após uma pausa no diálogo sobre ocasiões possíveis, obtive uma percepção – viagem – interessante. Clarice Lispector, certa vez, discorreu sobre como nós seríamos se fossemos realmente quem somos. “Se eu fosse eu”, é o texto que relata a reflexão acima citada. Afirma a autora, que se nós fossemos nós, talvez os amigos nem nos cumprimentariam na rua, visto que poderíamos estabelecer padrões de comportamento que hoje são considerados inaceitáveis por nossos meios sociais. “Beleza! Isso ela já escreveu! Você vai plagiar, Igor?”. Não, muito pelo contrário, pois, foi somente a partir deste mote que Clarice nos deixou, que acabei por me encontrar sem mote algum. Explicarei: “se eu fosse eu, acho que não faço a menor idéia de quem eu seria”. “Ai, calma, tive ‘rebosteio’ mental” (sim, eu tive). Se eu fosse eu, eu não sei o que seria, eu não consigo me imaginar sendo eu, entende? Eu não sei dizer como agiria se eu pudesse ser eu – sim, eu não sei. Não posso pelo simples fato de não saber o que ser. Acredito que me relativizei demais, me questionei demais e respondi de menos, usei muito “será?” no pensamento. Clarice que me desculpe, mas, para mim, respostas são fundamentais e, no momento, não tenho absolutamente nenhuma para me dar.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Amnésia desejada.


Faz frio. Para ele, o clima gélido já não era mais um problema, pelo contrário, conseguia dar sentido a tudo o que sempre sentira. Seu processo semiótico, como o de qualquer outra pessoa, era singular – algo relacionado aos signos e significações da semiótica o fazia relacionar frio com solidão. No inverno, portanto, tudo era mais aceitável. Ultimamente, porém, algo o andava inquietando. Como era de costume, o rapazote cheio de vida encenada, pensava demais sobre tudo o que era permitido se pensar. Foi quando, em conversa passageira de cigarros acesos, percebeu que ter conhecimento suficiente sobre coisas, e poder pensar sobre elas, era cruel.

No dia seguinte, sem desprezar o pensamento que havia tido, resolveu pensar sobre a crueldade existente na capacidade de raciocínio. Chegou à conclusão de que não era crueldade todos terem permissão para refletir, mas que era de maldade ímpar deixar que cada um pudesse se colocar como objeto para se pensar. Para ele, isso era uma condição dolorosa. Poder se analisar, se questionar, se comparar e se perceber era tudo o que ele não queria. “Que eu saia de meus pensamentos!”, era o que desejava com mais freqüência. Queria ser Macabéa, mas sem o final digno de estrela que ela teve. Queria ser anônimo, para sempre, para si. “Auto-ignorância deve ser uma dádiva”, afirma o descontente.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Enquanto as pálpebras não se fecham...


Os devaneios da madruga são os melhores. São aqueles sem compromisso, aqueles que podem ser paridos sem medo de serem arrancados com o fórceps brutal a que somos expostos enquanto temos a “companhia” indesejada das pessoas. Pensamentos inconseqüentes são tidos, refletidos e, o melhor de tudo, exauridos naquele período pequeno, porém precioso, que ocorre ao passarmos de acordados, para “dorminhados”.

Lembro-me de quando era mais moço. Toda noite, antes de dormir, eu me imaginava um herói do desenho “x-man” – adorava a animação. Eu tinha um pouco de cada um dos personagens, mais ou menos uma junção de todos os que faziam parte da extraordinária equipe do professor Charles Xavier. Sinto falta de conseguir desejar essas (bobagens?).

Hoje, talvez, se eu fosse criança - e tivesse a consciência de que crescer não vale a pena - confesso que faria de tudo para aproveitar cada segundo daquela fase mágica. Contudo, fico pensando: é possível uma criança ter consciência de que a infância é a melhor parte da vida? Acho que não! Afinal, seria muito cruel permitir a uma pessoinha de 7 ou 8 anos, saber que somente nessa época de sua estadia entre os vivos, sua felicidade seria pura, completa e, irremediavelmente, concreta.

Não quero que pensem, caros amigos leitores, que sou um depressivo em estágio pré-manicomial, apenas gostaria que notassem que sou um nostálgico em estágio pré-menstrual (?) (seria ótimo poder justificar todo esse aperto esquisito no peito com três letras: TPM).

A chuva cai lá fora, eu olho para o guarda-roupa e penso no que vestir amanhã se estiver chovendo; a Laila Dominique – minha gatinha – insiste em tentar dormir dentro do meu armário - é a terceira vez em meia hora que a tiro de lá. Minha mãe - exausta de jogar paciência no computador - dorme com a TV ligada no quarto. E eu aqui, acordado, pensando em como me livrar, sem grande estresse, das atividades que me aguardam amanhã no trabalho; pensando em como terminar a faculdade; pensando em como conhecer, em Curitiba, alguém interessante para se namorar. Enfim, pensando em como me tornar um super herói, com poderes reais, que sejam capazes de transformar 24 horas de um dia em 48, pois para conseguir levar uma vida social boa ao ponto de conhecer a pessoa exata, trabalhar e, ainda por cima, fazer um curso superior, só mesmo tendo dois dias dentro de um.

Realmente, fazendo uma avaliação dos pensamentos pré-sono – quero frisar que este texto é mais um desses pensamentos - consigo perceber que gosto muito mais das alucinações de herói que tinha na infância. Não que eu queira fugir da vida adulta - longe de mim ter medo – queria apenas que ela fugisse de mim, queria que a vida adulta, ao se deparar comigo, agisse com covardia.

É, não é por nada não, mas acho que está na hora de dormir. Boa noite.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Qual é mesmo o seu nome?


Regina Gremel, 56 anos e mulher por identificação. Desde que se conhece por gente sofre de reumatismo, doença chata, complicada, que requer constante tratamento. Diarista por condição (não conseguiu terminar o ensino fundamental por causa daquela velha história da inocência cruel das criancinhas) infelizmente nunca teve condições de pagar um plano de saúde, ou seja, é usuária do sistema único de saúde, nosso velho conhecido SUS.

Rosto familiar entre os médicos e enfermeiras da unidade de saúde Cajuru, bairro em que mora, há quase trinta anos convive com a rotina de consultas e exames, e mais consultas e mais exames. Ruiva, 1,77m de altura, calça jeans cós alto (aprendeu com a mãe que cós baixo deforma o corpo da mulher) sapato chanel e casaquinho de crochê, lá vai ela para sua consulta mensal. Sempre se sentiu muito grata pela gentileza com que é tratada no postinho (Regina sempre diz que não é acostumada a receber muitas gentilezas das pessoas).

Firmino Correia! Grita o médico, chamando o próximo paciente. Senhor Firmino Correia! De cabeça baixa, o rosto queimando de vergonha, levanta o senhor Firmino, ruivo, 1,77m de altura, calça jeans cós alto, sapato chanel e casaquinho de crochê. É nessa hora que as crianças na fila do “Zé Gotinha” zombam (Regina se recorda dos coleguinhas rindo dela na 7ª série) as mães olham torto, e o médico olha para dona Regina e, cordialmente, cumprimenta: “Bom dia, Seu Firmino”.

No dia oito de março deste ano, na cidade de Curitiba, o Secretario Estadual da Saúde, senhor Gilberto Martin, assinou uma resolução que regulamenta a possibilidade de pessoas transexuais serem chamadas por seu nome social no serviço público de saúde. A solenidade contou com a presença de travestis e transexuais que agradeceram pela oportunidade de ter um acesso mais digno ao sistema.

Considero a atitude um marco importante na luta pelos direitos humanos, mas não consigo não me perguntar qual foi o real motivo que levou a esse avanço, visto que desde 2004 o Ministério da Saúde já havia dado permissão e recomendação para tal processo. Talvez seja devido ao fato de ser ano eleitoral. Mas talvez seja uma ordem presidencial, tendo em vista que ninguém mais, ninguém menos que o nosso Presidente da República acessa qualquer serviço com o seu nome social (mudado até no RG). Afinal, quem é o dirigente mais popular de todos os tempos no Brasil? Luiz Inácio ou o Lula?

domingo, 23 de maio de 2010

Polemizar pra quê?


Desde que o PLC 122/2006, que define os crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero, entrou em discussão no Senado, muitos comentários e criticas infundadas têm sido feitas.

Há os que dizem que a lei cerceia a liberdade de expressão; contudo, vale ressaltar que mesmo a liberdade de expressão que nos é concedida tem limites, visto que ela não pode ser utilizada para discriminar qualquer ser humano.

Outros, cheios de moral religiosa, dizem pior, afirmam que a liberdade religiosa será reprimida e, por isso, atentam constantemente, através de seus parlamentares eleitos, contra o PLC. Será que não sabem que o Estado é laico? Ou seja, religião não deve, e sequer pode, interferir no que diz respeito aos direitos comuns. Sim! É direito comum ter uma religião ou não ter, obviamente se esse fato não excomungar – utilizemos esse verbo religioso por diversão – ninguém de seus direitos.

No Brasil, o relatório anual do GGB – Grupo Gay da Bahia – que desde 1980 lista os assassinatos de homossexuais no país, apontou, que em 2008, houve 55% mais crimes do gênero do que no ano anterior, 190 ante 122. Dessa maneira, o país tornou-se o mais homofóbico do mundo, seguido pelo México, que registrou 35 assassinatos na mesma época (é terrível saber que aqui, somente no estado do Paraná, em 2009, foram 25 pessoas mortas pelo fato de ter uma orientação sexual não heterossexual).

Normalmente, políticas públicas e leis são feitas e/ou propostas a partir da constatação de sua real necessidade (acredito que os números acima citados constataram bem) mas se não foram suficientes, não custa nada reafirmar com outras pesquisas. A homofobia não interfere somente no que tange ao bem estar físico dos cidadãos homossexuais, mas também no social, segundo a pesquisa de 2003, “Juventudes e Sexualidades”, da UNESCO, em média 40% de alunos do sexo masculino não gostariam de ter colegas de classe LGBT, e o pior é saber que os pais concordam com isso, cerca de 35% deles partilham da mesma opinião, e os principais argumentos para tais idéias giram em torno de questões religiosas.

Não é preciso dizer que quando um fator interfere negativamente nos direitos fundamentais do cidadão, é de suma importância revê-lo. Portanto, se as expressões religiosas são motivos que impedem seres humanos de se desenvolverem socialmente - preconceito na escola - elas devem ser revistas.

“A pessoa preconceituosa tende a partir do princípio de que ela própria é o modelo ideal de ser humano, condenando à exclusão social todos os que aparentemente se diferem dela. Um ‘cristão’, que pratique qualquer ato de repulsa contra outra pessoa, é um paradoxo”, afirma o Bispo Edir Macedo, líder evangélico religioso da Igreja Universal do Reino de Deus, maior da categoria no mundo, em texto publicado em seu blog pessoal. Podemos, assim, perceber incoerência dentro das próprias instituições religiosas.

Sabe-se que muitos já foram mortos na história por investidas de religiões fundamentalistas. Acredito ainda que a pluralidade étnica, racial, religiosa, enfim, cultural do nosso país, precisam ser levadas em consideração quando o assunto são os direitos humanos. Com isso, a comunidade de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, pede somente uma coisa: nem menos, nem mais, apenas direitos iguais.